Fractura eXposta

Thursday, March 29, 2007

Estou na dúvida

Não se me hei de preocupar mais com toda a problemática inerente à questão de Bolonha ou com o facto do director da nossa prestigiadíssima faculdade não saber utilizar correctamente um rato...

(Boas férias a todos e aproveitem-nas bem... Parece-me que vão ser cada vez mais raras!)

Monday, March 19, 2007

Fracturinha 7

Duas gorduras passeiam-se no intestino delgado quando de repente são atacadas por sais biliares, uma delas começa a chorar e pergunta a outra:
-Então que se passa?
Responde a outra:
-Nestas alturas fico sempre emulsionada....

Tuesday, March 06, 2007

A instituição- Parte II

(...)

Um sorriso aflorou nos lábios da pessoa de branco quando lhe respondeu
- Nada é impossível para a “Instituição”, bem o sabeis. Esta será uma ofensiva como nunca antes vista. Recuperaremos os nossos cavaleiros e atacaremos aquilo que os está a afastar de nós. Só terão espaço para a nossa causa. A sua vida terá de ser dedicada a nós.
E, num entusiasmo febril, continuou.
- O que nos levou os discípulos foi, como disseste, o tempo. Mas não o tempo futuro, a metereologia, um pretérito imperfeito ou o tempo dos relógios. Foi o tempo livre. A distracção. O desinteresse. O relegar para segundo plano. O ceder aos prazeres mundanos da vida. É isto que temos que combater. É por isso que vos chamei aqui hoje. Temos tarefas para distribuir e tratar.
O entusiasmo propagou-se para os restantes elementos da mesa. Parecia um plano viável. Aliás se “ela” o dizia, como não o poderia ser?
- Vamos atacá-los em todas as frentes!- bramiu um correlegionário já de uma certa idade, que fumava cachimbo
- Absolutely!! - concordou um indivíduo que, apesar da aparência latina, insistia em falar inglês.
- Conquistar-lhe-emos a mente e serão nossos por inteiro!- anuiu outro...
Um brilho de triunfo iluminava os olhos da mulher de branco...
-Obrigado, bem sabemos da lealdade dos vossos três institutos à Instituição. Por isso tenho missões especiais para vós: Sigmung!- o terceiro indivíduo que falara ajeitou-se na cadeira- Terás a tarefa de criar ocupações inúteis. Fazê-los perder o seu tempo em coisas desesperantes e, ao mesmo tempo, inofensivas. Enquanto os mantivermos ocupados não haverá grande espaço para distracções e futilidades.
O homem, de barba e olhar profundo, anuiu.
- Tony Body!-bramiu a pessoa de branco, dirigindo-se ao indivíduo pseudo anglo-saxónico- Para ti a missão é um pouco mais complexa. Quero que os faças perder um pouco mais do tempo que ainda lhes resta. Com trabalhos pequenos. Aos poucos e poucos. Separa-os em grupos de desconhecidos. Quebra os elos de amizade já estabelecidos. Obriga-os a trabalhar no escuro. E, se possível, fá-lo em inglês... só para ser um bocadinho mais difícil... Ou ainda melhor! Experimenta misturar inglês e italiano... verás como soa perfeito!
Tony Body acenou entendendo que compreendera a missão...
- Popeye!- dirigindo-se ao homem de cachimbo- A tua missão é semelhante. Abordar temáticas horríveis, testá-los, ocupar-lhes o tempo,... já agora, sabes qual é o maior mal à nossa causa?
- A televisão?- inquiriu o homem, confuso...
- Não... O fim de semana! Esse antro de distracção e perdição... arranja também alguma forma de lhes tirar isso!
E assim continuaram... a distribuir tarefas maquiavélicas, com um entusiasmo crescente. Todos rejubilavam. Era, efectivamente, uma ofensiva como nunca antes vista!
-... finalmente tu, meu fiel Wart... Tu que já criaste tantas gerações de cavaleiros perfeitos... Tenho para ti a mais perfeita das missões. Quero que lhe retires o pouco tempo que ainda lhes sobra... Fá-los perder imenso tempo para coisas mínimas... Sei lá... uma semana inteira para 10 minutos! Contudo, 10 minutos de verdadeiro terror, daquele que só tu sabes fazer! Parece-me perfeito!
- Às suas ordens... E, já agora, por curiosidade, quais serão as suas tarefas?
A mulher inclinou-se para a frente, brincando com um pedaço perdido de pão endurecido que alguém deixara ali como que por acaso. Poderia tomar aquela frase como uma ofensa ou uma indirecta à sua inacção. Mas conhecia Wart à muito tempo para saber que ele conhecia-a bem demais para acreditar que ela ficasse parada em tal ofensiva...
- Meu caro Wart. Não penses que não guardei o melhor para mim. Ainda não engoli as ofensas que me foram dirigidas. Irão pagá-las. Agora diz-me tu, qual o período de tempo em que os futuros cavaleiros da nossa causa mais se dedicam à inactividade e ao luxo da displicência do tempo?
- ... As férias?- inquiriu, em dúvida, Wart
- Exacto! As férias! Esse mundo de debilidade mental e atestado de incompetência! Não mais os nossos discípulos terão direito a tal! E mais... como vamos de enigmas?- inquiriu dirigindo-se ao indivíduo que fora receber Wart à porta do casarão...
- Optimamente...Em Junho terá ao seu dispor enigmas tão ou mais dificeis que aqueles que já lhe entreguei anteriormente numa 1ª fase... Perderão todo o tempo que lhes resta nisso!
- Perfeito... E ainda há mais!- via-se que saboreava cada palavra que dizia- Atacarei ainda aquilo que todos julgámos inexpugnável!
- O quê?- inquiriu Sigmund- As praxes?
- A noite da Medicina?- quis saber Popeye
- The Partys?- questionou Tony Body
- Os jantares no Cinderela?- perguntou Wart
-Como se esses precisassem de ser combatidos... Já estão em vias de extinção!- gracejou- Não, algo de muito maior, mais importante, mais inacessível
Conseguia palpar a curiosidade no fundo dos olhares dos seus companheiros e, com um sorriso maldoso nos lábios anunciou
- Os Jogos Olímpicos!!!
E enquanto observava o espanto espelhado na cara de todos soltou uma gargalhada maquiavélica que fez com que todos se arrepiassem. O riso maléfico espalhou-se pelos cantos e recantos da velha casa, galgou paredes e janelas e saiu para a noite fria. Assustou o gato que voltara a brincar na esquina, perdendo-se depois, levado pelo vento gélido da madrugada..
Ao longe, um bando de morcegos, levantou voo de um dos prédios da grande urbe. E uma nuvem voltou a cobrir a lua.

Monday, March 05, 2007

A instituição- Parte I

A lua já ia alta quando um ruído quebrou o silêncio da noite. Enquanto o mundo dormia e repousava da extenuante rotina citadina um vulto negro atravessava a cidade. Caminhava apressado como se estivesse atrasado para algo muito importante. Não se conseguia ver a cara.
Dobrou uma esquina no seu passo ligeiro, assustando um gato que, como o do poeta, por ali brincava despreocupado...
Deteve-se diante duma casa antiga. Sombria. Talvez por efeito duma nuvem que cobrira momentaneamente a lua ou por efeito do próprio casarão. Parecia abandonada. As ervas do jardim cresciam desorganizadamente como o vulto constatou ao ter de atravessá-lo aos ziguezagues. Um arrepio percorreu-lhe a espinha ao subir os degraus da entrada. Por cima da imponente porta principal numa enorme placa de pedra lia-se nuns caracteres antigos: “Instituição”.
Não havia campaínha. Bateu à porta. Uma e outra vez. Três pancadas secas e vigorosas na porta. Demorou algum tempo até ouvir passos do lado de dentro. Rodaram as fechaduras, a porta abriu-se. Um homem também totalmente vestido de negro esperava-o. Trazia um cigarro inacabado na mão direita. Dirigiu-se-lhe numa voz monocórdica e característica.
-Está atrasado, Mr.Wart.
-Assuntos a tratar...- limitou-se a dizer- A reunião já começou?
O outro não respondeu. Levou o cigarro à boca e voltou costas, sendo seguido de perto pelo misterioso Mr. Wart.
Conduziu-o por corredores pequenos e sombrios. A casa parecia tão velha por dentro como por fora. Ainda assim mantinha uma dignidade ímpar. A certeza da elegância, o culto do mistério, os mil e um segredos e histórias milenares encerrados naquelas paredes.
Entraram numa sala ampla. Algumas pessoas os esperavam. Mr.Wart tirou finalmente o sobretudo e o chapéu que ocultavam a sua face. Alguns dos presentes não conseguiram evitar uma inspiração. Apesar de o conhecerem há longos anos, o rosto deformado de Wart nunca era bonito de se ver.
O seu acompanhante apagou o cigarro com a soleira da bota. No topo da mesa uma figura recostava-se no seu cadeirão. Era a única pessoa em toda a sala que trajava de branco. Via-se também que emanava um certo poder. Autoridade. Bastou uma tossidela sua para calar todos os murmúrios que vagueavam pela sala.
-Boa Noite, Mr. Wart- a voz era rouca e seca, mas simultaneamente determinada- Sente-se! Temos muito a tratar esta noite ..
Wart sentou-se. A figura de branco levantou-se e tomou a palavra. Alguns dos presentes forçaram-se a chegar um pouco para trás nas cadeiras. Wart porém manteve-se impassível. Havia muito anos que sabia como as coisas funcionavam. E a sua lealdade e dedicação à causa nunca haviam sido postos em causa.
- Estamos hoje aqui reunidos de novo. A “Instituição” reeergue-se. Pela mais nobre das missões. Pela salvação da nossa arte. Nós, os mais ilustres, nós os representantes de tantos Institutos que formámos há tantos séculos atrás esta Instituição. Para que a nossa nobre missão não caia em desgraça nem em facilidades. Para que não haja distracções nem fugas. Para que não se perca o caminho. Os tempos são difíceis. Negros como jamais. A vulgaridade apoderou-se da nossa classe. Deixámos de ser a elite entre as elites, a nata duma sociedade. Perdemo-nos na vulgaridade e na generalização. Até o sangue já pouco conta. Isto não toleraremos. Contra isto lutaremos. Cabe-nos a nós reconstruir as muralhas do nosso castelo, expurgar tudo o que nos é indesejável, e formar os nossos novos cavaleiros. Obedientes, racionais, impassíveis, frios, mecânicos. Perfeitos!
E com isto voltou a sentar-se na cadeira, enquanto uma tempestade de aplausos e vivas ecoava pela sala. Apenas Wart não se moveu. A sua sobrancelha deformada mostrava as dúvidas que o assolavam...
- Mas como?- inquiriu quando os ruídos de anuência se calaram. Todos os rostos viraram-se para o fitar mas ele não vacilou- Sim, como? Como mudar os dados de um futuro já lançado e arrancar as raízes de um presente interiorizado? Como trazer de volta o tempo em que tudo era perfeito?

(To be continued...)